08 agosto 2016

Excessivo uso do “sim” na Educação dos Filhos


Este texto foi escrito para você, que neste momento passa por problemas com seu filho, ou até mesmo conhece alguém que esteja nessa situação. Aliás, coisa cada vez mais corriqueira nos dias de hoje. Quando paramos para pensar na nossa infância (para aqueles que têm mais de 30 anos), ficamos chocados com o que vemos. Crianças desde a mais tenra idade desafiando seus pais que vêm sendo feitos reféns dessas criaturinhas. Sou mãe, tenho dois filhos homens (26 e 23 anos) e não posso citar um único momento em que passei vergonha com eles. Sim, vergonha: essa é a palavra, pois muitos pais ficam completamente constrangidos diante de seus “anjinhos” em determinadas situações.
 Para saber isso, basta olhar ao redor. Verdadeiras guerras psicológicas são travadas em ambientes públicos (restaurantes, supermercados, escolas, lojas), com acessos de birra, gritos e palavrões, deixando os pais sem ação diante da situação. A única coisa que vem à cabeça é exatamente aquela que não deveria ser pensada: ceder.
Pois é, a palavra “ceder” parece a única coisa a ser feita para desarmar o circo e acabar com a plateia que assiste admirada ao desfecho do show. Uns olhando com tom de desaprovação, achando aquilo tudo um absurdo, outros com olhar penalizado, seja para os pais ou para aquela criança. O embaraço é geral e a vontade dos pais é a de que se abra um buraco enorme, para que lá possam se enfiar...
 Felizmente, nunca passei por essa situação vexatória com meus filhos. Fui mãe com 22 anos e, quando paro para pensar, vejo que usei muito da minha intuição. Claro que poderia ter feito coisas diferentes em muitos momentos, mas no geral me considero uma boa mãe.
 Além de mãe, sou professora e lido diariamente com crianças e adolescentes na escola em que trabalho. A angústia em relação ao comportamento abusivo das crianças frente aos pais acaba refletindo no ambiente escolar. Quando iniciei minha carreira no magistério, as coisas não eram bem assim. O que mudou? Sempre me faço essa pergunta, afinal, é um problema que vem aumentando e tomando proporções assustadoras.
Há muitos anos, as famílias eram estruturadas de uma forma mais ou menos parecida: pai (o provedor), mãe (a cuidadora e amorosa) e os filhos. Sem grandes traumas, obedecia quem tinha juízo, afinal, o pai seria comunicado à noite de qualquer desobediência. O castigo poderia ser físico (umas palmadas) ou ficar sem algo de que gostassem muito. Não estou aqui fazendo apologia aos castigos físicos, apenas relatando uma realidade que existia na maioria das famílias.
Muitas pesquisas são feitas para determinar o tipo de família hoje existente. Vou me ater à minha experiência pessoal, uma vez que estou mergulhada nesse processo e vivenciando os avanços e retrocessos dessas mudanças. Livros e mais livros são vendidos no Brasil falando sobre filhos, como educá-los, prepará-los para o futuro e por aí vai. São bastante procurados, demonstrando o quanto os pais estão perdidos nesse processo de educar uma criança.
Não vou prometer aqui um manual de instruções, pois as crianças não vêm com um quando nascem. Aliás, o que os pais mais me pedem são “receitinhas prontas” de como educar os filhos, como se isso fosse possível.
 Não existem receitas prontas, mas existem algumas coisas que podem ser feitas para que a educação de nossos filhos não acabe de maneira desatrosa e nos fazendo querer abrir um buraco no chão cada vez que somos colocados em uma “saia justa”. Porém, elas dependem de uma única coisa: VOCÊ!
De acordo com Tiba (2011), existe uma grande diferença entre “criar” e “educar” um filho. Percebo essa dificuldade nos pais hoje em dia. Eles chegam na escola completamente perdidos, não sabendo mais o que fazer para serem respeitados. Quando questionados, dizem que fazem de tudo, não deixam faltar nada, tudo que o filho pede é prontamente atendido. Ainda segundo Tiba: “Neste ponto, os pais erram quando poupam seus filhos e lhes dão tudo pronto, deixando-lhes um usufruto a custo zero, e perdem a oportunidade de educá-los”. ( 2011, p. 84). Depois não entendem a rebeldia e a falta de limites. Criar é dar a ele condições de sobreviver, alimento, roupas, abrigo, carinho. Educar é transmitir valores, capacitando-o para viver em sociedade, impondo regras, dando exemplos positivos.
Ouço essa história já há uns 10 anos e confesso que fico ainda perplexa. Não é possível que os pais não entendam que dar tudo aquilo que o filho pede não está certo. Hoje o pedido é algo simples, mas crianças crescem e acabam se transformando em “monstros consumidores”, que se não forem atendidos, irão atrás de satisfazerem suas necessidades, alimentadas pelos pais que não souberam dizer um ‘não’ quando era preciso.
Este “não” deve vir sempre junto de um “porquê”. O não sozinho dá ideia de que hoje não, mas amanhã talvez. Os pais devem estar cientes de que apenas uma negativa não será suficiente. Nem sempre aquele pedido vem atrelado a uma necessidade. Muitas vezes, ou na maioria delas, o filho quer algo simplesmente porque seu amigo tem. E se for atendido, sempre que nos olharem com aquela carinha linda, estaremos encurralados, pois as crianças sabem manipular muito bem um adulto quando querem. Não são aqueles “anjos” que achamos, podem acreditar.
Aquele bebezinho lindo, gordinho, cheio de dobrinhas que batia em seu rosto e todos achavam bonitinho cresceu. Nunca lhe foi ensinado que bater era errado. Ele cresceu achando que era normal e resolve continuar batendo no rosto das pessoas e esperando aprovação. Isso parece óbvio demais, mas muitos pais não enxergam além, vendo naquele gesto apenas uma forma de demonstrar carinho. E as consequências posteriormente aparecem, muitas vezes, de uma maneira dura e real. Quando de fato educamos um filho, devemos mostrar-lhes desde muito cedo o certo e o errado. Já presenciei cenas de arrepiar, bebês chorando loucamente quando são colocados no berço e a mãe (quase sempre é ela) desesperada tentando acalmar o choro. Aquele choro manhoso, que rapidamente para quando sua vontade é atendida. Raciocinem comigo: se fosse de fato uma dor ou incômodo, o choro cessaria tão prontamente?
Muitos pais têm medo de causar algum tipo de trauma, achando que se negarem algo ao filho este o odiará. Bobagem! Filhos querem e necessitam de limites. Precisam de referências e de saber até onde podem ir. Portanto, a palavra limite deve ser uma constante na vida de pais que querem acertar.  Costumam me questionar a respeito de como consigo manter minha sala de aula tão silenciosa. Quando alguém bate na porta e entra, costuma perguntar: “Estão em prova?”. Respondo com uma negativa, afinal, a sala de aula deve ser um ambiente tranquilo e sem gritarias. É um local de reflexão, concentração. Todos ali devem entender que estão juntos em um mesmo ambiente. Falar baixo, ser organizado, ter bom senso e acima de tudo, respeito pelo colega e pela professora. Consigo isso através de uma relação baseada na cumplicidade e no diálogo. Eu respeito-os e eles a mim.
 Ouço com frequência dos meus alunos que se tirarem boa nota ganharão algo: um passeio, videogame novo, celular. Fico tremendamente contrariada quando escuto isso de uma criança, pois esse tipo de coisa é inadmissível. A criança precisa entender que não existe troca quando o assunto é estudar, comportar-se bem, ser um bom filho. Todas essas coisas são consequências que virão naturalmente, sem necessidade de haver uma troca. Converso muito sobre isso com eles e nas reuniões com os pais procuro deixar isso bem claro.
Sejam pais participativos. Procurem saber da vida de seus filhos, como foi seu dia, se podem ajudar em algo. Muitos pais esquecem disso e quando o filho estiver na adolescência será mais complicado para recuperar o que foi perdido. O diálogo deve existir sempre, é uma conquista diária, um laço que tende a se solidificar com os anos. Filho precisa confiar nos pais, entender que podem contar com nosso apoio e com nossa “bronca” se for o caso. Mas, para isso, você precisa ser um exemplo.
Não é fácil ficar centrado o tempo todo, como se fôssemos monges budistas em busca da Iluminação. Sofremos com o estresse do dia a dia, contas para pagar, trânsito caótico, mau-humor, etc. Há dias em que é complicado respirar fundo e dar atenção ao filho, mas, isso precisa ser feito. Nem que seja por alguns momentos, mas devemos encontrar um ponto de equilíbrio e fazer o que parece ser impossível: deixar os problemas de lado e olhar nos olhos daquele que está na nossa frente. Cury nos diz que: “Reeditar é um processo possível, mas complicado. A imagem que seu filho construiu de você não pode mais ser apagada, só reeditada. Construir uma excelente imagem estabelece a riqueza da relação que você terá com seus filhos”. ( 2003, p. 23).  Portanto, vale a pena tentar!
Se você chegou até aqui está de parabéns, isso demonstra o quanto está motivado a fazer a diferença na vida de seu filho ou de alguém que conhece e ama muito. Você é demais... Um elogio é sempre bem vindo, não acham? Também adoraria saber que estou agradando um leitor e mantendo sua atenção, em meio a tudo que está acontecendo ao seu redor nesse momento: buzina de carro, barulho de televisão, música alta, crianças gritando, celular apitando. Nós somos movidos pelo elogio. A criança quando faz algo que achamos bonitinho tende a repetir a ação muitas vezes. Se for uma ação positiva, ótimo. Mas se for negativa, ela repetirá sempre que sentir nossa aprovação. Novamente vou citar o bebê gordinho e cheio de dobrinhas que batia no rosto do papai. Certamente vocês já viram crianças fazendo algo repreensível e os pais achando tudo lindo, filmando, tirando fotos, batendo palmas e simplesmente fixando naquela criança um comportamente socialmente inconveniente. Essa criança irá crescer e obviamente reproduzirá esse comportamento. De nada vai adiantar os pais brigarem, pois, na cabeça da criança o que ela faz está certo.
A boa notícia é que o contrário também acontece. Elogiar um bom comportamento terá o mesmo efeito. Aquela criança que entra na sua sala e pede “com licença” ou quando lhe fazemos algo nos olha e diz “obrigada” nos faz quase cair para trás, pois o que vemos hoje em dia é bem diferente disso. Pensamos: “ Minha nossa, o mundo ainda tem jeito”. Essas crianças foram elogiadas quando fizeram isso e acabaram tornando esse ato um hábito. É normal ser gentil e educada e, cá entre nós, não existe coisa mais linda do que uma pessoa educada. Existem pessoas que estudaram pouco, trabalham pesado, em profissões humildes, mas de uma educação que encanta e emociona.
Se você teve seus pais próximos a você na infância deve ter ouvido inúmeras vezes esta frase: “ Devemos sempre respeitar os mais velhos”. Basta ligar a televisão para nos deparamos com notícias terríveis de espancamento de jovens, crianças, animais. O mundo parece estar de ponta-cabeça. Tudo isso teve uma origem. Aquela pessoa que espanca outra pessoa já foi uma criança. Talvez tenha sido criada em um lar em conflito, com pessoas sendo agredidas, fazendo uso de drogas e bebida alcoólica. Famílias desestruturadas acabam criando filhos rebeldes e sem nenhum parâmetro social. Mas esse fato ocorre também nas famílias ditas “estruturadas”, com um poder aquisitivo razoável, com responsáveis tendo cursado uma boa universidade. O respeito pode existir sempre, não importa o poder aquisitivo nem tampouco o grau de instrução. Respeito é algo que se aprende através do exemplo. Se eu sou respeitado, eu aprendo a respeitar. Simples assim.
Os pais precisam estar unidos da educação de seu filho. Hoje em dia, muitos casais não vivem mais juntos e os filhos se aproveitam dessa situação. Normalmente a criança fica com a mãe e esta deve agir com firmeza, exercendo sua autoridade ao máximo. Nos finais de semana, quando a criança vai para a casa do pai, tudo é permitido, não existem regras, apenas diversão. Não existe um ponto de equilíbrio e a mãe passa a ser a “bruxa má” da história. Situações assim são comuns e não deveriam acontecer. O relacionamento acabou, mas o filho será para sempre um vínculo entre as duas pessoas. Quanto mais saudável e respeitosa for essa relação, melhor será para seu filho.
Espero até agora estar conseguindo manter você atento a essa leitura. Não prometi um manual de instruções, mas disse que daria dicas importantes. Manter a palavra é algo sério e deve ser cumprido à risca. Assim é com nossos filhos. Se você diz uma coisa e faz outra rapidamente, será pego em flagrante, pois criança tem uma sensibilidade enorme para captar essas vaciladas que damos. Cuidado com as palavras e com seus atos. Se não houver sintonia entre eles, tudo cairá por terra. Sempre digo para meus alunos que sou professora 24 horas do meu dia. Sinto-me constantemente observada e sei que sou de fato observada. Eles me questionam se fumo, se saio para ir a bares, observam minha roupa, minha forma de agir, se faço uso de maquiagem. Assim são nossos filhos. Como dizer: “ Leia meu filho, ler é importante para sabermos as coisas”, se nunca fui vista por ele com um livro nas mãos. Essas contradições são frequentes entre os pais de meus alunos. Eles querem que os filhos façam o que eles não fazem.
Educar, portanto, exige muita paciência e entrega. Ter filhos não é meramente colocá-los no mundo. É algo que deve ser planejado cuidadosamente, pois é extremamente bom ser mãe. Digo isso sem medo de estar sendo piegas. Uma das maiores realizações da minha vida tem nome: meus filhos.
Mas, se você enfrenta problemas com seus filhos, saiba que para tudo existe uma solução. Existem muitos profissionais dispostos a ajudar, mas para isso, é preciso aceitar que existe a dificuldade e ir ao encontro da solução. Muitas crianças são rotuladas de agressivas, mal-educadas, preguiçosas, desatentas e por trás pode existir algo neurológico, algum transtorno que impede essa criança de agir de maneira diferente. Isso existe e é bastante comum nos dias de hoje.
Tive um aluno que veio com histórico preocupante. No início do ano, quando passaram a lista de chamada me alertaram sobre ele. Uma criança agressiva, agitada, sem limites e cujos pais não pareciam estar muito preocupados. Como professora, acabei desenvolvendo em mim um lado bastante observador e deixei aquele aluno na dita “quarentena”. Observava-o em sala, no recreio, nas aulas de educação física, no momento que os pais vinham buscá-lo na escola. Depois de algumas semanas pude ter uma noção do que conversar com os pais e chamei-os para uma reunião. Os pais vieram e me pareceram bastante apreensivos, uma vez que seu filho já vinha sendo rotulado de diversas coisas. Ouvi o que me disseram e perguntei sobre a gravidez, os primeiros dias, meses e ano. Os pais ficaram surpresos, pois até então nenhum professor havia questionado a respeito.
Colocando-me na condição de ouvinte e em nenhum momento fazendo críticas, descobri que o menino, até seu primeiro ano, havia tido crises de otite (infecção no ouvido) quase que frequentes. Chorava muito e os pais costumavam utilizar remédios caseiros para as crises. Solicitei que fossem a um otorrinolaringologista, que após um exame constatou baixa audição. Uma criança que gritava, era agressiva e não ouvia bem, após um tratamento e colocação de um dreno (tubo colocado dentro do ouvido) para retirar as secreções, ficou mais calma e conseguiu acompanhar melhor as aulas, não sendo mais tão criticada e desenvolvendo um bom relacionamento para com todos os demais colegas da classe.
Fiz esse relato para ilustrar que nem sempre devemos castigar nossos filhos. Muitas vezes, eles não sabem ser diferentes simplesmente porque não conseguem. Alguns pais ficam frustrados, dizem que deram uma boa educação, com limites bem estabelecidos, mas mesmo assim o filho não corresponde.
Devemos descartar sempre se existe algum tipo de patologia (doença) ou transtorno, para depois agirmos de modo a corrigir a atitude de uma criança. Para isso, contamos com a ajuda de muitos profissionais, principalmente, com a ajuda do professor, pois é ele quem fica a maior parte do tempo com seu filho e pode apontar caminhos para minimizar as dificuldades. Por isso, ouça-o, tenha o professor de seu filho como aliado, um amigo em que você deve confiar.
Se você conseguiu chegar até aqui, parabéns! Vamos finalizar com uma lista de verbos que devem estar presentes na sua vida para lidar com uma criança: ouvir, dialogar, exemplificar, respeitar, elogiar, cumprir, estudar, planejar, estabelecer e, acima de tudo, AMAR!

BIBLIOGRAFIA

CURY, Augusto Jorge. Pais brilhantes, professores fascinantes. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.

TIBA, Içami. Pais e Educadores de Alta Permormance. São Paulo: Integrare, 2011.


Leila Bambino, graduada em Pedagogia com especializações em Psicopedagogia Institucional/ Clínica e Educação Especial. Na área clínica atuei durante 5 anos e como professora exerço a profissão há 20 anos em uma escola pública estadual na cidade de Blumenau – Santa Catarina. http://leilabambino.blogspot.com.br/


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